As Instituições financeiras com intuito de incentivar o consumo, através de créditos com taxas de juros menores e com inadimplência irrisória criaram entre outras, as contribuições facultativas: que é o empréstimo consignado na folha de pagamento do servidor público, através do qual as parcelas dos empréstimos serão descontadas diretamente do salário destes servidores.
Pelo princípio constitucional de proteção ao salário do trabalho, que veda qualquer forma dolosa de redução deste salário, nos termos do artigo 7º, X, sabiamente o legislador limitou o valor que poderia ser descontado dos servidores públicos, para se evitar justamente o que ocorre hoje, ou seja, o superendividamento em massa dos servidores públicos.
Com toda a evidência, a abusividade nasce quando se permite que o desconto seja feito sem atender à preservação de um mínimo suficiente ao sustento do consumidor, no caso em tela o Servidor Público.
Se as cláusulas contratuais das financeiras permitem uma apropriação de mais de 30% da remuneração do contratante, são sem duvida, dotadas de abusividade, por passar a infringir princípios fundamentais do sistema jurídico brasileiro, que buscam preservar o salário da pessoa, sua dignidade, o seu sustento e de sua família.
Contudo, vários Servidores Públicos em todo o território Nacional vem sendo afetados por descontos em folha de pagamento, acima do legal permitido, mas autorizado contratualmente, neste caso é configurada a abusividade na falta de limites para o desconto, visto que os descontos das parcelas referentes aos empréstimos bancários absorvem quase toda a verba salarial do Servidor Público, o que acaba por impossibilitá-lo de adimplir com seus compromissos.
Quando o legislador tornou impenhorável a verba salarial, que tem caráter alimentar, o fez no intuito de proteger a sobrevivência material da pessoa, impedindo que o pagamento das dívidas recaia sobre essa parcela de seu patrimônio, destinado à sua alimentação e sobrevivência. Todavia, isso não quer dizer, que o titular da conta-corrente salarial não possa, por ato voluntário, dispor de parte dela, para facilitar a satisfação de uma dívida.
Frisa-se, que fica configurada a abusividade quando se permite que o desconto se faça de forma ilimitada, sem atender à preservação da margem legal dos 30 %, cabendo ação judicial para adequação ao valor legal.
Por analogia às Leis que regulamentam as consignações em folha de pagamento, o Servidor Público não deve ter comprometido mais que 30% do salário líquido creditado mensalmente, o inc. I, do § 2º. do Art. 2º, da Lei n. 10.820, estabelece que: “a soma dos descontos em folha do empregado não podem exceder a 30% da remuneração disponível. O art. 11 do Dec. 4.961/04 também limita a soma mensal das consignações facultativas do servidor a 30% dos seus vencimentos”.
A solução justa e que atende à eqüidade contratual e os princípios fundamentais está em limitar o comprometimento da verba salarial a patamar razoável; o que sabiamente vem fazendo nossos tribunais de justiça, limitando a 30% o desconto no salário para pagamento de empréstimos.
Importante frisarmos, que quando se ajuízam as ações judiciais de adequação de percentual de margem, a concessão da liminar para diminuir as parcelas dos empréstimos consignados, ao valor da margem legal, não traz prejuízo algum às financeiras ou ao Servidor, mesmo porque o Servidor Público não deixará de adimplir com sua dívida, estará sim pagando o que é legalmente previsto de margem (30%), razão pela qual entendemos o perigo de dano irreparável que ocorre ao Servidor Público, que a se ver em situação precária frente ao poderio das instituições financeiras, retirando-lhe até mesmo a dignidade humana, salvaguardada pela Constituição Federal Brasileira, sofrendo inúmeros constrangimentos, ao não conseguir adimplir as suas demais contas, terá seu nome incluso no Serasa/SPC, dificultando ainda mais a sua vida, pois todo o seu salário ficará para as financeiras, que se utiliza da fragilidade financeira vivida pelo servidor público, cujos reajustes salariais estão sempre em defasagem com a realidade econômica do país.
A demanda judicial
Para propor a ação judicial é necessário fazer o recálculo das parcelas do contrato de financiamento para avaliar a possibilidade de ajuizamento de uma ação revisional. Para isso, ter em mão o contrato é fundamental.
Caso o consumidor não tenha recebido, no ato da contratação, sua via do referido documento, a saída é ajuizar uma demanda chamada “medida cautelar de exibição de documento“, prevista no artigo 844 do Código de Processo Civil, em que a financeira terá o prazo de cinco dias para juntar aos autos toda documentação afeta ao empréstimo ou financiamento.
De posse do referido documento, passa-se à elaboração do recálculo, único meio de confirmar se os juros praticados estão de acordo com os juros cobrados e, principalmente, informar o valor justo, correto e legal que o consumidor deveria estar pagando pelo seu empréstimo ou financiamento.
Importante lembrar que no caso em apreço, em que o servidor, aposentado ou pensionista foi surpreendido com alteração drástica de sua capacidade financeira, justificando-se a tutela jurisdicional no sentido de limitar em 30% os descontos em seus rendimentos líquidos, o recálculo mostrará o desequilíbrio existente naquela relação jurídica a ser posteriormente revisada.
Sobre o tema, assim tem entendido nossos Tribunais:
“Ante a natureza alimentar do salário e do princípio da razoabilidade, os empréstimos com desconto em folha de pagamento (consignação facultativa/voluntária) devem limitar-se a 30% (trinta por cento) dos vencimentos do trabalhador” (REsp 1.186.965/RS, Rel. Min. MASSAMI UYEDA, DJe 03.02.2011).
“O pagamento de mútuo bancário, por meio de desconto em folha de pagamento e débito em conta corrente em que é creditado o salário, deve respeitar o limite de 30% (trinta por cento) da remuneração do servidor público, sob pena de dar ensejo à lesão de difícil reparação, com risco de comprometimento da própria subsistência do devedor”. (20110020045135AGI, Relator CARMELITA BRASIL, 2ª Turma Cível, julgado em 04/05/2011, DJ 09/05/2011 p. 111.)
“Conforme prevêem os arts. 2º, § 2º, I, da Lei 10.820/2003, 45 da Lei 8.112/90 e 8º do Decreto 6.386/2008, a soma dos descontos em folha referentes ao pagamento de empréstimos, financiamentos e operações de arrendamento mercantil não poderá exceder a 30% (trinta por cento) da remuneração disponível do trabalhador. É que deve-se atingir um equilíbrio (razoabilidade) entre os objetivos do contrato e a natureza alimentar do salário (dignidade da pessoa humana). Precedentes do STJ”. (AgRg nos EDcl no REsp 1223838 /RS AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL 2010/0219279-7 Ministro VASCO DELLA GIUSTINA DJe 11/05/2011)
Enfim, está provado que a margem consignável esta sendo calculada de forma que contraria a Lei, o que veda as consignações facultativas acima da margem consignada de 30% calculada sobre os vencimentos ou proventos dos servidores públicos sobre o valor liquido, pois a Lei autoriza a exclusão da remuneração líquida do servidor a renda bruta subtraída dos descontos obrigatórios, nos termos da legislação e jurisprudência vigente, e, conseqüentemente, a medida que se impõe é a readequação das parcelas das consignações que excedem o limite consignável legal, sob pena de ferir os princípios constitucionais de proteção ao salário e da dignidade humana, que vem amplamente sendo deferido pelo judiciário, que tem visado assim uma solução legal para a questão social implicada pelo superendividamento do Servidor Público.